terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

MÓDULO 3 - RESPONSABILIDADE DO ESTADO - BASES PROCESSUAIS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

RESPONSABILIDADE DO ESTADO 


INTRODUÇÃO


                              A moderna teoria do órgão público sustenta que as condutas praticadas por agentes públicos, no exercício de suas atribuições, devem ser imputadas ao Estado. Assim, é natural considerar que o Estado responde pelos prejuízos patrimoniais causados pelos agentes públicos a particulares, em decorrência da função administrativa.

                              Nesse tema responsabilidade do Estado iremos investigar o dever estatal de ressarcir particulares por prejuízos civis e extracontratuais experimentados em decorrência de ações ou omissões de agentes públicos no exercício da função administrativa.

                              O tema é disciplinado pelo artigo 37, § 6º da Constituição Federal: “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.


1. Evolução Histórica

 a)          TEORIA DA IRRESPONSABILIDADE – também chamada de teoria feudal, regalista ou regaliana, a teoria da irresponsabilidade do Estado era própria dos Estados Absolutistas nos quais a vontade do Rei tinha força de lei. Os monarcas eram considerados “representantes de Deus na terra”, escolhidos e investidos diretamente da própria divindade. Por isso, eventuais prejuízos causados pelo Estado deveriam ser atribuídos à providência divina e, se Deus não erra, o atributo da inerrância se estendia aos governantes nomeados por Ele.


b)           TEORIA DA RESPONSABILIDADE SUBJETIVA- conhecida também como teoria da responsabilidade com culpa, teoria intermediária, teoria mista ou teoria civilista. O Estado passa a ser responsável por todos os casos de condutas ilícitas. A responsabilidade subjetiva exige:

 -  conduta,

-  dano, sob pena de enriquecimento ilícito,

- nexo causal e

- culpa ou dolo.

         Portanto, essa teoria se apóia na lógica do direito civil, na medida em que o fundamento da responsabilidade é a noção de CULPA. Daí, a necessidade de a vítima comprovar, para receber a indenização, a ocorrência simultânea dos 4 requisitos acima:  ato, dano, nexo causal e culpa ou dolo.

         Embora tenha representado um  grande avanço em relação ao período anterior, a teoria subjetiva nunca se ajustou perfeitamente às relações de direito público diante da hipossuficiência do administrado frente ao Estado. A dificuldade da vítima em comprovar judicialmente a ocorrência de culpa ou dolo do agente público prejudicava a aplicabilidade do funcionamento prático da teoria subjetiva.

         Entretanto, importante destacar que, excepcionalmente, a teoria subjetiva ainda é aplicável no direito público brasileiro, em especial quanto aos danos por omissão e na ação regressiva.



c)           TEORIA DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA – também denominada teoria da responsabilidade sem culpa ou teoria publicista, afasta a necessidade de comprovação de culpa ou dolo do agente e, fundamenta o dever de indenizar na noção de RISCO. Quem presta um serviço público assume os risco dos prejuízos que eventualmente causar,independentemente da existência de culpa ou dolo.

         Para esta teoria, o pagamento da indenização é efetuado somente após a comprovação, pela vítima, de 3 requisitos: ato, dano e nexo causal.

         A excludente da responsabilidade pode vir com a ausência de qualquer dos três elementos. Há duas teorias para responder essa pergunta:  teoria do risco integral, o Estado responde sempre, não se admitindo excludente;  teoria do risco administrativo, admite-se excludente quando faltar qualquer dos elementos.

         No Brasil, aplica-se a TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO, ou seja, há excludente de responsabilidade civil objetiva do Estado brasileiro, ou seja, ausência de qualquer dos elementos exclui a responsabilidade.

São excludentes, a culpa exclusiva da vítima, força maior e culpa de terceiro.

Vejamos:

- Culpa exclusiva da vítima – ocorre culpa exclusiva da vítima quando o prejuízo é conseqüência da intenção deliberada do próprio prejudicado. São casos em que a vítima utiliza a prestação do serviço público para causar dano a si própria. Exemplo: suicídio em estação do Metrô; pessoa que se joga na frente da viatura para ser atropelada.

 No caso de CULPA CONCORRENTE em que a vítima e o agente público provocam, por culpa recíproca, a ocorrência do prejuízo. Nesses casos, fala-e em concausas. Exemplo: acidente de trânsito causado porque a viatura e o carro do particular invadem ao mesmo tempo, a pista alheia. Nesses casos, a questão se resolve com a produção de provas periciais para determinar o maior culpado. A culpa concorrente NÃO exclui responsabilidade, mas diminui. Se não houver como saber quanto cada um participou no dano, jurisprudência é no sentido de dividir ao meio.

- força maior -  é um acontecimento involuntário, imprevisível e incontrolável que rompe o nexo de causalidade entre a ação estatal e o prejuízo sofrido pelo particular. Exemplo erupção de vulcão que destrói vila de casas.

         Segundo Alexandre Mazza, em sua obra Manual de direito administrativo, 3ª edição, Saraiva, 2013, p. 328, o caso fortuito não exclui a responsabilidade estatal, aquele que o dano é decorrente de ato humano ou de falha da Administração. Exemplo: rompimento de adutora.



- culpa de terceiro – ocorre quando o prejuízo pode ser atribuído a pessoa estranha aos quadros da Administração Pública. Exemplo: prejuízo causado por atos de multidão. Mas, no dano provocado por multidão, o Estado responde se restar comprovada a culpa.

         Cabe destacar que, a TEORIA DO RISCO INTEGRAL, entretanto é aplicável no Brasil, em situações excepcionais:  Vejamos:

- acidentes de trabalho (infortunística): nas relações de emprego público, a ocorrência de eventual acidente de trabalho impõe ao Estado o dever de indenizar em quaisquer casos, aplicando a teoria do risco integral.

- Indenização coberta pelo seguro obrigatório para automóveis (DPVAT): o pagamento da indenização do DPVAT é efetuado mediante a simples prova do acidente e do dano decorrente, independentemente da existência de culpa, haja ou não resseguro, abolida qualquer franquia de responsabilidade do segurado (art. 5º da Lei nº 6.194/74).

- atentados terroristas em aeronaves:  por força do disposto nas Leis n.ºs 10.309/2001 e a de nº 10.744/2003, a União assumiu despesas de responsabilidade civil perante terceiros na hipótese de ocorrência de danos e bens e pessoas, passageiros ou não, provocados por atentados terroristas, atos de guerra ou eventos correlatos, ocorridos no Brasil ou no exterior, contra aeronaves de matrícula brasileira operadas por empresas brasileiras de transporte aéreo público, excluídas as empresas de táxi-aéreo (art. 1º da Lei n. 10.744/2003)

- quantos aos danos ambientais –  segundo aponta Alexandre Mazza, em sua obra Manual de direito administrativo, editora Saraiva, 3ª edição, 2013, p. 327: “por força do art. 225, § § 2º e 3º da CF , há quem sustente que a reparação do prejuízo ambiental causados pelo Estado seria submetida à teoria do risco integral. Porém, considerando a posição majoritária entre os jusambientalistas, é mais seguro defender em concursos a aplicação da teoria do risco administrativo para anos ambientais”.


2. ELEMENTOS – CF/88 – artigo 37, § 6º


(A) PESSOAS


“As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.


“As pessoas jurídicas de direito público”: administração direta, autarquias e fundações.


“as de direito privado prestadoras de serviços públicos”: empresas públicas, sociedades de economia mista, concessionárias.


“Seus agentes, nessa qualidade”: agente é qualquer um que exerça função pública. Mas tem que ser na qualidade de servidor; se servidor resolve matar esposa no final de semana, obviamente não cabe indenização do Estado.

(B) CONDUTA


Hoje, apesar de o Brasil adotar a responsabilidade objetiva, convivem ambas as responsabilidades, objetiva e subjetiva.


(1) ATO COMISSIVO. Na conduta comissiva, aplica-se a RESPONSABILIDADE OBJETIVA.


(2) ATO OMISSIVO.  Nos casos de omissão por ato ilícito, aplica-se responsabilidade subjetiva, exigindo-se dever legal e dano evitável (Estado não é salvador universal, precisa estar dentro da reserva do possível). Caso do preso que se suicida com roupa do colega; neste caso, suicídio é inevitável; caso preso se suicide com arma que entra na prisão, há dever descumprido, Estado responde.


(3) SITUAÇÕES DE RISCO. Quando o Estado cria uma situação de risco maior do que a necessária, o Estado responde por uma AÇÃO, responsabilidade objetiva, portanto. Exemplo: acidente causado por falha de semáforo. A regra geral, vez que a finalidade é proteção da vítima, é a responsabilidade objetiva. Material bélico, material nuclear etc. criam situações de risco pelas quais o Estado é responsável objetivamente. Preso mata o outro, Estado responde? Sim, por responsabilidade objetiva, vez que Estado assume risco ao colocar número exagerado de presos no mesmo local.

(C) DANO


Não é qualquer dano. Imagine-se museu, em torno do qual, inúmeros estabelecimentos aparecem; se Estado muda local do museu, não tem como indenizar, porque dano precisa envolver DIREITO. Dano precisa ser também CERTO (determinado ou determinável), ESPECIAL (vítima certa, dano particularizado) e NORMAL (trânsito não dá para indenizar, porque é dano normal; a mesma coisa com os danos causados por construção de viaduto: dano normal dessa atividade).


(D) DIREITO DE REGRESSO DO ESTADO CONTRA O AGENTE


          A Constituição Federal prevê a utilização de ação regressiva contra o agente, mas somente nos casos de dolo ou culpa. Assim, a responsabilidade do agente público é subjetiva, pois pressupõe a existência de dolo ou culpa.

         Essa ação regressiva é proposta pelo Estado contra o agente público causador do dano, nos casos de dolo ou culpa (art. 37, § 6º). Sua finalidade é a apuração da responsabilidade pessoal do agente público. Tem como pressuposto já ter sido o Estado condenado na ação indenizatória proposta pela vítima.

         Como a Constituição Federal determina que a ação regressiva é cabível nos casos de dolo ou culpa, impõe-se a conclusão de que a ação regressiva é baseada na teoria subjetiva.

         Em razão do princípio da indisponibilidade, a propositura da ação regressiva, quando cabível é um dever do Estado,  e não uma simples faculdade.

         Sobre a questão do prazo para propositura da ação regressiva, predomina o entendimento, baseado no artigo 37, § 5º, da CF/88, de que a ação regressiva é imprescritível. Todavia, quando se tratar de dano causado por agente ligado, a empresas públicas, sociedade de economia mista, fundações governamentais, concessionárias e permissionários, isto é, para pessoas de direito jurídicas de direito privado, o prazo é de 3 anos (art. 206, § 3º, V, do CC) contados do trânsito em julgado da decisão condenatória.



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