BENS PÚBLICOS
1. Conceito- Histórico
Segundo o Código Civil de 1916, artigo 65: “São públicos os bens do domínio nacional pertencentes à União, aos Estados, ou aos Municípios. Todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem”. DF não consta porque não existia quando da redação do CC, em 1899; assim tampouco autarquias e fundações públicas. Doutrina e jurisprudência passaram a incluir esses entes no dispositivo. E empresas públicas e sociedades de economia mista? Também incluídos como bens públicos, ainda que com particularidades.
No Código Civil de 2002, em redação dada pelo seu artigo 98, “São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem”.
Entre os administrativistas, porém, o conceito apresentado pelo Legislador civil não é aceito por todos os autores. Pelo contrário, é possível agrupar as diferentes opiniões sobre o alcance do conceito de bens públicos em algumas correntes principais:
a) corrente exclusivista: para alguns doutrinadores, o conceito de bens públicos deve estar necessariamente vinculado à ideia de pertencerem ao patrimônio de pessoas jurídicas de direito público. É a visão defendida por José dos Santos Carvalho Filho, para quem bens públicos são “todos aqueles que, de qualquer natureza e a qualquer título, pertençam às pessoas jurídicas de direito público, sejam elas federativas, como a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, sejam da Administração descentralizada, como as autarquias, nestas incluindo-se as fundações de direito público e as associações públicas”. (em sua obra Manual de direito administrativo, p. 1073).
Sendo a concepção explicitamente adotada pelo Código Civil brasileiro (art. 98), a corrente exclusivista é a mais aceita pelas bancas de concurso público. Porém, tal visão tem o grande inconveniente de excluir do conceito dos bens públicos aqueles pertencentes às empresas públicas e sociedade de economia mista prestadoras de serviço público, bem como os de propriedade das concessionárias e permissionárias afetados à prestação de serviços públicos.
b) corrente inclusivista: segundo Maria Sylvia Zanella di Pietro e Hely Lopes Meirelles, consideram bens públicos todos aqueles que pertencem à Administração Pública direta e indireta. Tal corrente peca por não tornar clara a diferença de regime jurídico entre os bens afetados à prestação de serviços públicos (pertencentes ao domínio das pessoas estatais de direito público e ao das pessoas privadas prestadoras de serviços públicos) e aqueles destinados à simples exploração de atividade econômica, como os que fazem parte do patrimônio das empresas públicas e sociedades de economia mista exploradora de atividade econômica.
c) corrente mista: adotada por Celso Antonio Bandeira de Mello, entende que são bens públicos todos os que pertencem a pessoas jurídicas de direito público, bem como os que estejam afetados à prestação de um serviço público. Essa conceituação é, segundo nossa opinião, a mais coerente à luz do direito positivo nacional por incluir no conceito de bens públicos, reconhecendo-lhes um especial tratamento normativo, os bens pertencentes a pessoa jurídica de direito privado, estatal ou não, indispensáveis para a continuidade da prestação dos serviços públicos, como ocorre com parcela do patrimônio de empresas públicas, sociedades de economia mista, concessionárias e permissionárias de serviços públicos.
Todavia, como já mencionamos, para concursos públicos tem sido preponderantemente aceita a corrente baseada no artigo 98 do CC, denominada exclusivista, que considera públicos somente os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público.
2. CLASSIFICAÇÃO
A. QUANTO À DESTINAÇÃO
- DE USO COMUM: ou bens do domínio público são aqueles abertos a uma utilização universal, por toda a população, como logradouros públicos, praças, mares, ruas.
Nesse sentido, afirma o artigo 99, I, do Código Civil: “são bens públicos; I – os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas, e praças”.
Os bens de uso comum do povo, enquanto mantiverem essa qualidade, não podem ser alienados ou onerados (art. 100, do CC). Somente após processo de desafetação, sendo transformados em dominicais, poderiam ser alienados.
- DE USO ESPECIAL : são também chamados de bens do patrimônio administrativo, são aqueles afetados a uma destinação específica. Fazem parte do aparelhamento administrativo sendo considerados instrumentos para execução de serviços públicos. São exemplos: edifícios de repartições públicas, mercados municipais, cemitérios públicos, etc.
Conforme dispõe o artigo 99, II do Código Civil (ver referido dispositivo).
- BENS DOMINICAIS: também chamados bens do patrimônio público disponível ou bens do patrimônio fiscal, são todos aqueles sem utilidade específica, podendo ser “utilizados em qualquer fim ou, mesmo, alienados pela Administração Pública.
São exemplos: terras devolutas, viaturas sucateadas, terrenos baldios, carteiras escolares danificadas etc.
A Administração Pública pode, em relação aos bens dominicais, exercer poderes de proprietário, como usar, gozar e dispor. È nesse sentido que o artigo 99, III, do CC define tais bens como aqueles que “constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades.” Tais bens podem seralienados, nos termos do disposto na legislação, por meio de compra e venda, doação, permuta, etc.
B. QUANTO À TITULARIDADE
Os bens públicos se dividem em federais, estaduais, distritais, territoriais ou municipais, de acordo com o nível federativo da pessoa jurídica a que pertençam.
C. QUANTO À DISPONIBILIDADE
- Bens indisponíveis por natureza: aqueles que, devido à sua intrínseca condição não patrimonial, são insuscetíveis a alienação ou oneração. Os bens indisponíveis por natureza são necessariamente bens de uso comum do povo, destinados a uma utilização universal e difusa. São naturalmente inalienáveis. È caso do meio ambiente, mares e do ar.
- bens patrimoniais indisponíveis: são aqueles dotados de uma natureza patrimonial, mas, por pertencerem às categorias de bens de uso comum do povo ou de uso especial, permanecem legalmente inalienáveis enquanto mantiverem tal condição. Por isso, são naturalmente passíveis de alienação, mas legalmente inalienáveis. Exemplos: ruas, praças, estradas e demais logradouros públicos.
- bens patrimoniais disponíveis: são legalmente passiveis de alienação. È o caso dos bens dominicais, como as terras devolutas.
3. CARACTERÍSTICAS
- INALIENABILIDADE. Observe-se que essa característica aplica-se a bens de uso comum e especial, não de uso dominical, cf. CC: 100, “Os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação, na forma que a lei determinar” e CC: 101, “Os bens públicos dominicais podem ser alienados, observadas as exigências da lei”. Há doutrinador que entende ser a inalienabilidade característica RELATIVA, na medida em que basta desafetar bens para uso dominical a fim de aliená-los. Para alienar, lei de licitações, artigos 17 e 9 da Lei 8.666/93.
- IMPRESCRITIBILIDADE. Inviabilidade de bem público ser adquirido por prescrição aquisitiva. CC16 foi o primeiro a positivá-lo. Doutrina incumbiu-se de justificar a imprescritibilidade, entendendo que usucapião seria sanção da inércia, incompatível com o interesse público. Doutrina, porém, passou a entender que usucapião seria possível para bens dominicais, refutado pelo STF pela súmula 340, “Desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, bem como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião”. Hoje, a proibição é trazida duas vezes pela Constituição (CF: 183, § 3º e 191, par. único), além do artigo 102 do Código Civil.
Segundo doutrina majoritária, a imprescritibilidade é atributo de todas as espécies de bens públicos, incluindo os dominicais.
EXCEÇÃO a essa regra vem prevista no artigo 2º da Lei 6.969/81, que admite usucapião especial sobre terras devolutas localizadas em área rural.
- IMPENHORABILIDADE: decorre do fato de que os bens públicos não podem ser objeto de constrição judicial (penhora). A impenhorabilidade é uma decorrência lógica da inalienabilidade na medida em que, por ser insuscetível a alienação, a penhora sobre bem público constitui medida inútil. Importante destacar, também que a impenhorabilidade dos bens públicos é a justificativa para a existência da execução especial contra a Fazenda Pública e da ordem dos precatórios(art. 100 da CF).
- NÃO ONEROSIDADE (por direito real de garantia), que se circunscreve aos bens de uso comum ou especial, mas não dominicais, cf. CC: 1.420, “Só aquele que pode alienar poderá empenhar, hipotecar ou dar em anticrese; só os bens que se podem alienar poderão ser dados em penhor, anticrese ou hipoteca”. A não onerosidade decorre da inalienabilidade.
4. FORMAS DE UTILIZAÇÃO DE BENS PÚBLICOS POR TERCEIROS
A utilização de bens públicos por terceiros pode ser regida pelo direito privado ou público. A seguir, os institutos de direito público.
- AUTORIZAÇÃO DE USO.
- PERMISSÃO DE USO. Observe-se que permissão de uso é diferente da permissão de serviço, que tem caráter de contrato. A permissão de uso é ato negocial, unilateral, precário, pelo qual a Administração transfere um bem a particulares. DIFERENÇA ENTRE PERMISSÃO E AUTORIZAÇÃO. Difere de autorização de uso em seu caráter negocial, ou seja, permissão de uso é o meio termo entre ato e negócio, porque, apesar de ainda ser ato unilateral, oferece maiores garantias do que a autorização de uso. Além disso, exige licitação, de acordo com o art. 2º da lei 8666/93, “As obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações, concessões, permissões e locações da Administração Pública, quando contratadas com terceiros, serão necessariamente precedidas de licitação, ressalvadas as hipóteses previstas nesta Lei”.
- CONCESSÃO DE USO é o contrato administrativo, pelo qual a Administração transfere o uso exclusivo de um bem a terceiro (é uma figura contratual e estável). Exige LICITAÇÃO. Há debate doutrinário sobre a AUTORIZAÇÃO LEGISLATIVA: a maioria entende que não é necessária uma autorização legislativa para cada uma das concessões, bastando que a lei orgânica do Município etc. preveja essa possibilidade de maneira genérica.
- CONCESSÃO DE DIREITO REAL DE USO. Definição legal vem no art. 7º do Decreto-lei nº 271/67. Exemplo clássico: distrito industrial. É igual à concessão de uso, com a peculiaridade de a concessão de direito real de uso fazer parte de uma política específica (educacional, industrial etc.).
- CESSÃO DE USO é a transferência de um bem público para outra entidade ou órgão público ou para particulares que desempenham interesses gerais e legítimos (terceiro setor; exemplo: APAE). Quarto setor seria a economia informal e quinto setor seria o crime organizado.
- ENFITEUSE. Apesar de extinto pelo CC, ainda existe enfiteuse marinha, regulada pelo Decreto-lei nº 9.760/46 (que, ao lado da Lei 9.636/98, é bastante solicitado em concursos públicos federais). (Ver tais legislações)
- CONCESSÃO FLORESTAL. Definida pela Lei 11.284/06, art. 3º, VII. Unidades de conservação de proteção integral (uso permitido apenas indireto, como turismo) e unidade de conservação de uso sustentado (limite menor).
5. AFETAÇÃO E DESAFETAÇÃO
Os termos afetação e desafetação são utilizados em mais de um sentido pela doutrina especializada. Genericamente, tais expressões são usadas para designar a condição estática atual de determinado bem público. Se o bem está vinculado a uma finalidade pública qualquer, diz-se estar afetado; se não tiver tal vinculação, está desafetado.
Em outro sentido, os mesmos termos são empregados para se referir à alteração dinâmica de condição, de certo bem público. Assim, por exemplo, se determinado prédio público estava afetado à execução do serviço público de saúde, sendo a edificação derrubada por um terremoto, ocorre sua desafetação. Essa mudança na finalidade do bem pode se dar mediante lei, ato administrativo ou fato administrativo.
Finalmente, pode-se ainda falar em desafetação para designar o procedimento jurídico de transformação do bem público em bem dominical, mudando-o de categoria, para viabilizar sua futura alienação.
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