MÓDULO 1
Abreviaturas usadas:
CC – Código Civil.
CDC – Código de Defesa do Consumidor.
Cf. – conforme.
CF – Constituição Federal.
CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas.
CPC – Código de Processo Civil.
Noções Introdutórias de Responsabilidade Civil.
1. Conceito de Responsabilidade Civil.
2. Responsabilidade Jurídica e Responsabilidade Moral.
3. Resenha Histórica da Responsabilidade Civil.
Conceito de responsabilidade:
A RESPONSABILIDADE CIVIL é a obrigação que incumbe uma pessoa de reparar o prejuízo causado a outra, por ato próprio ou por ato de pessoas sob a responsabilidade do agente ou, ainda, por fato de coisas sob a guarda do agente.
Trata-se de obrigação que tem como fonte o ato ilícito, por descumprimento de contrato ou de preceito normativo, situação esta que não depende de relação contratual.
A obrigação de reparar o dano é princípio geral de direito dos mais antigos. Quem causa dano a outrem tem o dever de reparar.
A reparação visa em geral à recomposição do prejuízo. A responsabilidade civil é a obrigação que tem como fonte o ilícito – por descumprimento de lei ou de contrato.
No direito romano antigo, os delitos que acarretavam a responsabilidade civil do agente eram furto, injúria e dano.
A vingança, permitida nas origens, importava a retribuição privada contra o autor do prejuízo, com a ideia de que o dano poderia ser reparado com outro dano.
Com a Lei das XII Tábuas, em 450 a.C., inicia-se a ideia de autocomposição, com a restituição do prejuízo causado, pelo seu autor.
Em 286 a.C., no direito romano, na fase republicana, é criada a Lex Aquilia de damnum, fixando a necessidade de culpa para a caracterização da responsabilidade civil pela reparação do dano causado. Com essa lei, as penas passam a ser proporcionais ao prejuízo. É a regra da responsabilidade civil subjetiva, que depende de praticar, o agente, ação ou omissão com dolo, imperícia, imprudência ou negligência. A responsabilidade civil subjetiva é a regra basilar em nosso atual sistema, conforme a disciplina da matéria, no Código Civil.
O art. 186 do CC estabelece a regra:
“Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
E aquele que pratica ato ilícito e por isso causa dano a outrem, fica obrigado a repará-lo, nos termos do art. 927 do CC.
Uma das críticas ao art. 186 do CC é que nem sempre se viola direito (violação de direito é a violação da lei), pois às vezes a responsabilidade não depende da culpa do agente.
Outra crítica é que pode haver violação de direito sem prejuízo, sem dano, como no caso de violação do contrato que gera a obrigação de responder pelo valor fixado em cláusula penal, independentemente de comprovação de dano.
Os problemas que cercam a matéria de responsabilidade civil são: a reparação do prejuízo, a atribuição de responsabilidade e o modo como deve ser feita a reparação.
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A matéria no Código Civil.
No CC/1916:
A matéria da responsabilidade civil não estava sistematizada no CC/1916: havia dois art. – 159 e 160 – na parte geral, regulando a responsabilidade aquiliana e algumas excludentes de responsabilidade. Alguns artigos na parte especial, em dois diversos capítulos, também tratavam do tema.
Isso porque na teoria e na prática o tema não tinha a importância que hoje tem. O desenvolvimento tecnológico e científico aumentou o potencial lesivo das máquinas, ampliando o risco de danos. Tome-se, por exemplo, as transmissões de imagens, a violação dos direitos da personalidade, a internet, o trânsito nos grandes centros.
No CC/2.002:
A matéria da responsabilidade civil está sistematizada no Livro I da Parte Especial, que trata do direito das obrigações. O Título IX do Livro I da Parte Especial trata da responsabilidade civil (Cap. I – da obrigação de indenizar; Cap. II – da indenização).
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Do seguro de responsabilidade.
A importância da matéria de responsabilidade civil é crescente, e uma de suas consequências é o chamado seguro de responsabilidade, como se costuma contratar nas apólices para veículo automotor, com a cobertura de dano causado a terceiro.
Trata-se de socialização do prejuízo, evitando situações em que a vítima ficaria sem indenização, por falta de condição de pagamento pelo agente causador do dano, e de benefício ao segurado, que não corre risco de empobrecimento, desde que cause dano por culpa leve ou levíssima (não pode a seguradora responder por ato ilícito do segurado se o ato for doloso ou por culpa grave ou gravíssima).
O Código Civil em vigor prescreve que a reparação deve ser de forma a não deixar sem indenização a vítima, mas sem criar a pobreza do agente do ato ilícito.
Na tentativa de reparação integral, cria-se nova vítima, o delinquente, com o seu empobrecimento. Por isso o seguro de responsabilidade: todos pagam o prêmio, médicos, advogados etc., e assim a sociedade é que arca em caso de sinistro. O seguro sempre envolve uma socialização do prejuízo, pois a sociedade, considerando o grupo de segurados, rateia o prêmio, que servirá para a paga da indenização em caso de sinistro.
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Responsabilidade civil e penal.
O ato ilícito pode repercutir na ordem civil e na ordem penal.
Ocorre que a responsabilidade civil, normalmente patrimonial (já que a privação da liberdade atualmente só é possível em caso de falta de pagamento de pensão alimentícia, quando o alimentante pode recolher e não paga os alimentos), depende de violação de norma de direito privado.
A responsabilidade penal, com sanções diversas, como a reclusão, a detenção, decorre da violação de norma de direito público. Como antes escrito, o ato ilícito pode violar norma de direito público e de direito privado, como o homicídio, a violação da honra, a lesão corporal etc.
Prescreve o art. 935 do CC:
“A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal”.
A decisão no âmbito penal leva à desnecessidade de questionamento no cível, mas a recíproca não é verdadeira. A condenação no cível não implica condenação penal.
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Responsabilidade contratual e extracontratual (aquiliana).
Contratual – art. 389 do CC, estudada junto com o inadimplemento das obrigações. Aqui quem descumpre o contrato deve provar que não agiu com culpa – presume-se em favor da vítima a culpa do inadimplente. Há vínculo, pacto, contrato entre causador do dano (inadimplente) e vítima.
Não responde no âmbito contratual o menor, o incapaz, salvo se agir com dolo, mentindo sobre a sua idade, ou o incapaz antes da interdição, desde que pratique negócio jurídico com terceiro de boa-fé que não possa desconfiar da menoridade ou da incapacidade.
Extracontratual – art. 186, CC (e art. 927 do CC). Nesta espécie a vítima que alega o dano deve provar a culpa do agente causador do prejuízo, com algumas exceções que vamos verificar.
* Há doutrinadores que defendem não haver diferença entre responsabilidade contratual e extracontratual, com os seguintes argumentos:
1. Se ambas dependem de culpa, que é a infração de uma obrigação preexistente, não são diferentes a violação oriunda de contrato e a violação derivada de qualquer outra fonte.
2. O inadimplente de qualquer forma vai responder em pecúnia pelas perdas e danos.
Ocorre que há diferença, por exemplo, em matéria de prova – se a responsabilidade for extracontratual, a vítima deve mostrar e provar a culpa do causador do dano; na responsabilidade contratual, basta mostrar o inadimplemento que há presunção de culpa em favor do credor – o devedor (contratante inadimplente) é que deve demonstrar que não agiu com culpa, provando, por exemplo, que descumpriu o contrato por conta de caso fortuito ou força maior.
Outra diferença: na responsabilidade contratual o menor púbere em regra não responde, salvo se a obrigação tenha surgido de ato em que foi assistido. Já na responsabilidade extracontratual responde o menor púbere de qualquer forma, porque é equiparado ao absolutamente capaz para responder por ato ilícito.
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Os Princípios Fundamentais da Responsabilidade Civil.
Ato Ilícito e Conduta do Agente.
Dano - 2.1. Dano patrimonial. 2.2. Dano moral.
São requisitos em qualquer das espécies de responsabilidade:
Ação ou omissão, culpa, dano e nexo causal.
· Ação ou omissão do agente (ato comissivo ou omissivo) – o ato ou a omissão do agente pode defluir de ato próprio, de ato de terceiro que esteja sob a responsabilidade do agente, e ainda de danos causados por coisas que estejam sob a guarda do agente.
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A ação ou omissão infringe dever contratual, legal ou social.
Ex.: de omissão contratual – concessionária do serviço de fornecimento de energia elétrica, que não fiscaliza, é responsabilizada pela eletrocussão de uma pessoa causada por defeito em linha particular de transmissão; locatário é responsabilizado por não pagar o aluguel (a cláusula penal já é previsão das perdas e danos).
Ex.: de omissão com infração à lei – falta de socorro;
Ex.: de ação com infração à lei – disparar arma de fogo em local público.
Ex.: de infração a dever social – abuso de direito – ex.: retirar em servidão predial água do prédio serviente sem que haja necessidade real; manter em apartamento pequeno um número tal de animais que prejudique a convivência entre vizinhos.
· Dano.
O dano pode ser material ou moral.
O dano material envolve danos emergentes e lucros cessantes.
São danos emergentes aqueles patrimoniais decorrentes da perda direta de bens, ou de pagamentos e despesas que devem ser reembolsados pelo agente causador do dano.
Lucros cessantes são as verbas que razoavelmente se deixou de ganhar em função do ato ilícito.
Dano moral – não atinge o patrimônio da vítima, mas causa dor, tristeza, mágoa – perda de ente querido, de um membro; e dano à imagem, à vida privada, à honra, à intimidade (art. 5º, V e X da CF).
· Pessoa jurídica pode ter direito à indenização por dano moral – Súmula 227 do STJ. A imagem não é só a imagem retrato, mas também a imagem-atributo - a honra, o nome, a voz (conforme Luiz Alberto David Araújo – A proteção constitucional da própria imagem, ed. Del Rey).
· Art. 5º, V e X da CF – a honra, a imagem, a privacidade, a intimidade, são direitos fundamentais, que devem ser protegidos inclusive quando não se comprova a ocorrência de dano material.
· A indenização moral independe de dano material e pode com este se acumular.
· O conflito entre princípios constitucionais pode ocorrer (não ocorre entre leis infraconstitucionais, onde só uma pode ser aplicada). No conflito deve ser dada a máxima eficácia a cada um dos princípios, não se excluindo o núcleo essencial de cada princípio. Podem conflitar por ex.: princípio da liberdade de expressão e princípio de proteção à honra, à imagem, à intimidade, à vida privada.
· Cláusula pétrea – proteção contra dano moral (art., 60, §4º, IV, CF).
· A indenização por dano moral é ampla, sem teto de 200 salários mínimos, como previa a Lei de Imprensa (art. 52 e 51).
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Dos requisitos da responsabilidade civil (continuação).
3. Culpa e Risco.
4. Nexo de Causalidade.
A culpa do agente.
· Pela dificuldade da vítima em provar a culpa do agente, por ex. num atropelamento num beco escuro, é que surge a responsabilidade objetiva. Aqui há a presunção irrefragável da culpa, para que a pretensão de ser indenizado não se torne inatingível (veremos adiante a responsabilidade objetiva).
Culpa.
O art. 186 do CC traz a ideia da responsabilidade subjetiva – ação ou omissão voluntária (dolo) ou involuntária em que se constate imprudência ou negligência.
O dolo ocorre quando o agente antevê o dano que a sua atitude vai causar, mas deliberadamente prossegue, com o propósito mesmo de alcançar o resultado danoso.
A aferição da negligência ou imprudência não se faz comparando o comportamento do agente causador do dano com o de um homem médio, normal, tomado como padrão. Deve-se considerar a culpa in concreto, para averiguar se o agente causador do dano, com as suas características, e não com as características do homem médio, poderia ter evitado o dano.
A responsabilidade civil não depende da penal (art. 935, CC). A culpa pode ser insuficiente para ensejar uma condenação penal, mas suficiente para a condenação no cível (obs.: no crime também se pode condenar por ato culposo).
Graus de culpa: culpa grave, leve e levíssima.
Culpa grave – decorrente de imprudência ou negligência grosseira, como a do motorista que dirige sem habilitação ou avança um farol fechado (a culpa grave se equipara ao dolo).
Culpa leve – é aquela na qual um homem de prudência normal pode incorrer – esbarrar em uma estante de cristais, de uma loja.
Culpa levíssima – é aquela da qual um homem de extrema cautela não escaparia (tropeçar em um objeto, escorregar e lesar outrem).
No CC/1916 não importava o grau de culpa – a indenização se media pela extensão do dano (ainda que a culpa do agente fosse levíssima, cumpria-lhe reparar o dano). A indenização deveria ser a mais completa. Indenizar significa tornar indene a vítima. Ocorre que em caso de culpa levíssima tal solução não é justa. Às vezes por culpa levíssima causa-se um dano milionário. No CC de 2002, parágrafo único do art. 944, está que se a culpa for levíssima (agente prudente e cauteloso) e o dano muito grande, o juiz pode reduzir a indenização.
Obs.: Negligência é a omissão danosa – o agente deixa de fazer algo por distração. Deixa por exemplo de conferir os freios do carro; deixa de colocar o cinto de segurança na criança; deixa cair um vaso de cristal no chão; deixa a jaula do leão aberto; não puxa o freio do carro em um declive. Imprudência é a ação danosa – o agente atua causando dano. Exemplo: avança o farol vermelho; imprime velocidade alta ao veículo; direção perigosa; dirige sem CNH. Imperícia – quando causa dano por ação ou omissão que deveria evitar por ser técnico da área (médico, dentista etc.)
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Obs.: Da ideia de culpa negativa – a omissão implica em responsabilidade. E há presunção de culpa em certos casos.
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Relação de causalidade entre o comportamento do agente e o dano experimentado pela vítima deve haver um liame.
Se a ação do agente não é causa do dano, não há responsabilidade Ex.: culpa exclusiva da vítima, que se atira na frente de um carro; ou culpa exclusiva de terceiro, num engavetamento (no 115º exame de ordem da OAB/SP, havia uma questão prática que pedia defesa baseada neste argumento – a culpa não foi de quem bateu atrás, mas do terceiro, que jogou o carro do acusado para frente, ocasionando um engavetamento); ou dano decorrente de caso fortuito ou força maior, como é o caso de um prédio que cai por conta de terremoto – o dono não precisa indenizar os vizinhos (caso fortuito).
RESPONSABILIDADE CIVIL, Professor Helio Thurler
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Professor Helio Thurler |
Blog : "Estudando A Lei"
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